sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Basílica lota com fiéis para louvar São Francisco

A fé nordestina é renovada em mais uma Romaria de São Francisco, aberta com caminhada e missa

O negrume da noite ainda não havia se dissolvido no céu quando a Basílica de Canindé se encheu de luz para receber os fiéis no primeiro dia da Festa de São Francisco das Chagas. Na madrugada de ontem, moradores de Canindé e romeiros de vários Estados se dirigiram à praça para assistir à abertura da festa. O hasteamento das bandeiras foi seguido de uma missa às 4 horas, celebrada pelo reitor do Santuário, frei João Amilton dos Santos, que espera de 800 mil a um milhão de visitantes nos próximos dez dias.

"São Francisco nos ensina a sempre ter confiança em Deus, mesmo nos momentos de dor e sofrimento, e acredito que é isso que atrai tantos fiéis. Num mundo rodeado de coisas superficiais, ele nos convida a viver o Cristo pobre e fraterno", define o reitor. Após a missa, as portas do Santuário foram abertas para visitação. Centenas de romeiros encheram os bancos e se dirigiram ao altar para fazer suas preces.

Vestes marrons

A devoção se revela de diversas maneiras. Aos que portavam as tradicionais vestes marrons do santo se juntavam pessoas com celulares e câmeras fotográficas, registrando cada momento e adicionando novas formas de demonstrar o sagrado.

Os males do corpo e do espírito curados por São Francisco ganhavam forma no entalhe da madeira, transformados em ex-votos depositados na Casa dos Milagres. Outros depositam mechas de cabelo de si e dos parentes que não puderam fazer a romaria neste ano.

"Nasci e me criei em Canindé, e o nome nem precisa dizer de onde vem", brinca a aposentada Francisca de Sousa Soares, de 82 anos, que mora há mais de 30 em Fortaleza. Não perde uma festa de São Francisco, apesar da idade. Quando perguntada sobre o que sentia quando entrava no Santuário, o riso se transformou em lágrimas.

"Sinto muita saudade quando venho aqui. Hoje estou quase só, meu marido faleceu e sinto muita falta. Mas eu tenho meu São Francisco, que sempre me ouve quando peço alguma coisa", desabafa, voltando a sorrir.

Coração confortado

Durante todo o dia de ontem, outros Franciscos, Franciscas e Claras (em homenagem à Santa Clara, prima e apoiadora de São Francisco) mostraram que nenhum sacrifício é grande demais para aquele que, tão prontamente, atende pedidos e conforta corações.

Outras três missas foram celebradas, ontem, às 7h, 9h e 16h, além de uma procissão com o painel de São Francisco pelas ruas de Canindé. Nos demais dias, a programação começa às 5 horas, com a realização da Via Sacra na Avenida Francisco Cordeiro Campo, seguida por missas de hora em hora na Basílica.

A 252ª Romaria de São Francisco prossegue até o próximo dia 17. No período, a programação também inclui novenas, missas e confissões. Estas acontecem de 8h as 11h e de 11h as 16h, na Basílica de Canindé. No Complexo São Damião, acontecem os batizados, sempre no horário de 10h as 15h.

MAIS INFORMAÇÕES

Basílica de São Francisco das Chagas, em Canindé
(85) 3343.0017
(85) 3343.0447

PAGADORES DE PROMESSA

Fama de "milagreiro" é crescente

Canindé.
O primeiro milagre teria acontecido no século XVIII, ainda na reforma da primeira igreja erguida por Francisco Xavier. Um operário caiu de cima da torre e gritou o nome de São Francisco das Chagas. Imediatamente o corpo ficou preso numa trave, antes de chegar ao chão. Desde então, a cada ano, a fama de milagreiro do santo só aumenta, testemunhada por aqueles que não hesitam em ferir a própria carne para demonstrar sua fé e gratidão.

Há os que prefiram agradecer e fazer suas preces discretamente, nem gostam de dizer qual foi o milagre, alegam que a questão é entre eles e o santo. Já a estudante Francisca Clara Guilhermino deixa sua fé mais que evidente: vestiu a si e à sobrinha Maria Leidiane, de apenas um ano, com o hábito marrom e cordão branco na cintura. Mesmo sem idade para entender, começava para aquela criança uma história de devoção.

"Ela levou uma queda feia de moto, foi para o hospital duas vezes, a gente já estava se desesperando. Foi quando eu fiz uma promessa para São Francisco e ela ficou boa. Não tenho nem palavras para explicar, minha família toda é devota de São Francisco", explica.

Vindo de Batalha, no Estado do Piauí, o ambulante Francisco Vianna também se vestiu com a cor do santo dos pobres, "até a japonesa eu comprei marrom para vir a Canindé, mas deixei no abrigo". O motivo de não trazer o chinelo foi a forma de cumprir sua promessa: percorrer o trajeto do primeiro degrau da Basílica até o altar de São Francisco de joelhos.

Na última Semana Santa, Francisco Vianna fraturou o braço direito num acidente. Precisou ir para Teresina para recolocar o ombro, que tinha sido deslocado. Passou 22 dias com o braço engessado e um mês com o membro numa tipoia.

"A médica disse que havia o risco de eu perder os movimentos da minha mão. Eu chorava dia e noite, por causa da dor e do medo de fazer a operação e piorar". O vendedor ambulante conta que não conseguia fazer tarefas simples, como abotoar uma camisa ou abrir uma simples embalagem.

Foi quando ele se lembrou de se valer de São Francisco, a quem já havia recorrido em outras situações. Hoje ele mostra, emocionado, como consegue levantar o braço acima do ombro, algo que há poucos meses não conseguia fazer. "Ainda estou com três dedos um pouco dormentes, mas tenho fé de que vou conseguir voltar a mexer. Sempre venho a Canindé, e São Francisco nunca me faltou".

Neste período do ano, Canindé se transforma em um grande palco de pagadores de promessas. Cada um tem uma história de vida para contar, repleta de sofrimentos, já superados ou amenizados, por meio da clemência ao santo.

É o povo nordestino mostrando que, além da medicina dos homens, há uma mais poderosa, ativada pela fé.

(Fonte: Diário do Nordeste)

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